Uma discussão fundamental para as telecomunicações e para toda sociedade civil abriu os debates da Fliv-Rio 2023 nesta quinta-feira (5/10), primeiro dia do evento. A conversa, mediada por Marcello Miranda, diretor do Sinttel-Rio, teve como tema as normas, diretrizes e mecanismos para controlar as plataformas digitais.
Márcio Patusco, vice-presidente do Clube de Engenharia, trouxe para o público um apanhado sobre as discussões internacionais a respeito da relação entre as operadoras e as big techs – gigantes como Google, Apple e Microsoft –, responsáveis por mais de 70% do tráfego. Patusco ressaltou que há processos em curso para que as grandes plataformas paguem a mais por esse uso, o que poderia ter reflexos sobre a tarifa de todos os usuários.
O vice-presidente do Clube de Engenharia levantou ainda a questão do uso por parte das big techs de conteúdos produzidos por empresas jornalísticas. Já há acordos para pagamento dessa utilização na Austrália, países da Europa e Estados Unidos, mas é um debate que ainda patina por aqui. “Era um dos pontos do Projeto de Lei 2630 [que ficou conhecido como o PL das Fake News], mas foi retirado da pauta por pressão das plataformas”, explicou.
O palestrante falou ainda sobre novas plataformas e deu o exemplo da Starlink, empresa de prestação de serviços de Internet, que tem cerca de 4000 satélites de baixa órbita e oferece aos usuários sinal por meio de wi-fi, ou seja, prescinde de infraestrutura terrestre e pode, portanto, ser acessada de qualquer lugar do mundo. E alertou: “Essas plataformas precisam seguir as leis dos países onde se instalam. Precisam ser reguladas.”
A mesa seguiu com a advogada Flávia Lefèvre, advogada especialista em telecomunicações e direitos digitais e integrante da Coalizão dos Direitos da Rede, que abordou o PL 2630 a partir de diferentes aspectos. Flávia chamou a atenção para a dependência econômica do Brasil em relação às plataformas e da necessidade da implementação de políticas públicas para aumentar a diversidade de empresas que atuam no país para que haja democratização do acesso digital. “A Dataprev e Serpro, por exemplo, usam nuvem da Microsoft. Nós precisamos exercer nossa soberania. Não podemos disponibilizar dessa forma esses dados todos. Não podemos deixar essas plataformas atuando sem uma regulamentação. É uma questão política e geopolítica, além de econômica”, ressaltou.
Flávia falou ainda sobre os mecanismos de impulsionamento, recomendação e moderação de conteúdo das plataformas e suas implicações comerciais e econômicas, uma vez que 85% do lucro dessas empresas vem da coleta de dados. A advogada questionou ainda a possibilidade de uma agência reguladora realizar o papel de fiscalizadora e regulamentadora das big techs. Ela lembrou que essas agências surgiram para desonerar o Estado de uma função que é pública e a experiência das que já existem confirma que elas são passíveis de serem pressionadas economicamente. Uma alternativa seria a proposta de uma estrutura regulatória múltipla com representantes de diferentes entidades, empresas e poder público para exercer essa função. “A sociedade precisa se organizar e exigir mais transparência das plataformas. É urgente”, afirmou Flávia.