Extrema direita e bolsonarismo em pauta no encerramento do Fliv-Rio 2023

Um time de peso para apresentar diferentes visões sobre a extrema direita e o conservadorismo no Brasil. A sintonia entre os convidados levou à união de duas mesas previstas para a tarde do último dia do Fliv-Rio. Fernando Drummond, Jornalista do Diário do Centro do Mundo (DCM); Marcelo Barbosa, professor da ciência política da UERJ; João Cezar de Castro Rocha, historiador e professor de literatura comparada da UERJ; Paulo Henrique Cassimiro, cientista político e professor da UFRRJ; Roberto Amaral, ex-ministro de Ciência e Tecnologia do governo Lula; e Denis Maracci Gimenez, professor da UNICAMP, aprofundaram a análise sobre os desafios atuais diante do Bolsonarismo.

Fernando Drummond, iniciou o debate ironizando a versão de que o crime de assassinato dos quatro médicos, entre eles o irmão da deputada federal Sâmia Bonfim e cunhado do deputado Glauber Braga tenha sido um engano da milícia e não um crime político. “Este é o caso Marielle II. O ataque ao Estado e calar pessoas como Sâmia e Glauber são de interesse das milícias neopenteconstais. É um atentado à democracia”.
O jornalista também criticou o atual investimento do governo Lula na mídia tradicional e ressaltou que é preciso mudar a estratégia de comunicação para enfrentar a crise atual. “Tá na hora de botar o pé no chão da fábrica, subir a favela e discutir a realidade do acesso à comida, mais do que fazer os debates acadêmicos. Quem não se comunica se trumbica. O bolsonarismo está muito vivo. Menos Globo e mais rádio comunitária. Temos que ter investimento para fortalecer as comunidades de base. Nossa grande derrota hoje é da comunicação”, afirmou.

Marcelo Barbosa reforçou a importância da comunicação: “Disputar com o bolsonarismo não vai ser fácil. É preciso ter na base uma atuação e uma gramática para conversar com a população, o que a gente não tem tido. Se não há centro, a esquerda, de alguma maneira, tem que se deslocar em direção ao centro, não no sentido da institucionalização, mas é necessário uma cultura cívica na base da sociedade na defesa da democracia e da legalidade política” avalia. Para o escritor, “as classes dominantes se deslocaram em direção a Bolsonaro porque ele tinha condições de implementar a política neoliberal”, considera.
Já Paulo Henrique Casimiro destacou a importância de compreender o cenário atual. “É importante distinguir extrema direita de bolsonarismo. Bolsonaro reuniu neoliberais, saudosistas da ditadura, milicianos e seus adeptos, evangélicos de direita que viram nele uma alternativa. Essas identidades se agregaram por conta de um inimigo comum. O comunismo, a falsa ameaça à família que seria operada pelo PT”, avalia. O cientista político afirma que foram as bolhas informacionais que deram identidade forte a essa extrema direita. E que o principal desafio atual “não é derrotar o líder, hoje o Bolsonaro, mas sim desmontar a capacidade de construir versões de mundo extremistas dessas forças de direita”.

A dimensão internacional do conservadorismo foi destacada pelo professor João Cezar Castro Rocha. “Há um avanço transnacional da extrema direita. Esse não é um fenômeno brasileiro, mas transnacional que ocorre pela primeira vez por meio de eleições livres e democráticas. Bolsonaro foi eleito em 2018, o que não se pode questionar. Ele conquistou corações e mentes no Brasil, assim como Trump conquistou nos EUA”, afirmou.
Castro Rocha apontou um caminho de reação: “É preciso lançar mão de instrumentos do Código Penal brasileiro. Os crimes da extrema direita são muitas vezes digitais. Quase 100% das fake news incorrem em crime, especialmente crimes de calúnia e temos que reagir a isso com base na lei. Há mecanismos disponíveis”, avaliou.

A desilusão com a sociedade brasileira foi destacada pelo ex-ministro Roberto Amaral: “Nós da esquerda tomamos um susto ao descobrir que temos uma sociedade reacionária, racista e preconceituosa. E não poderia deixar de ser diante da formação histórica de nosso país” considera.

Por fim, Dênis Ximenes jogou luz sobre a responsabilidade das elites brasileiras na fragilização da democracia. “As nossas elites têm caráter oscilante: podem apoiar 1964 e depois chamar os militares de assassinos. Não há constrangimento quanto ao caráter oscilante, ora autoritário, ora liberal, mas sempre antidemocrático. Defendem não um governo de todos para todos, mas um governo de poucos para poucos. A tradição conservadora no Brasil sempre funcionou como uma força que neutralizava a extrema direita. Hoje, esse centro conservador foi destroçado, o que dificulta pensarmos saídas”, finalizou.